Damásio Evangelista de Jesus nasceu em 4 de julho de 1935, na Cidade de Cerquilho, no estado de São Paulo. 13 de fevereiro de 2020, Bauru, São Paulo. Ele foi jurista, professor e promotor, um dos maiores especialistas de direito penal.
Damásio tinha mais de 20 livros publicados. Era reconhecido internacionalmente pela atuação junto ao governo brasileiro na Organização das Nações Unidas para debater a prevenção ao crime, corrupção em transações comerciais internacionais e controle de porte e uso de armas, entre outros.
Damásio se aposentou em 1988 como procurador de Justiça.
Veja o Texto publicado originalmente em Temas de Direito Criminal – 1.ª série. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 82.
Nos tempos de faculdade, queria ser Juiz de Direito. Tanto que, na porta interna do guarda-roupa do antigo Hotel Tapajós, hoje Terra Branca, em Bauru, onde morei por alguns anos, escrevi um pensamento sobre o meu ideal: “Serei Juiz de Direito”.
Sempre estudei muito. Não havia diferença entre sábados, domingos e feriados. Quem passasse pelo hotel, de sábado para domingo, às 2 horas, veria uma luz de quarto acesa. Era eu estudando as “Instituições de Direito Penal”, de Basileu Garcia. Eu sabia que, para tornar-me alguém na vida, era preciso, naquelas madrugadas, ser um humilde e desconhecido estudante.
No segundo ano da faculdade, meu pai comprou para mim parte da coleção da Revista dos Tribunais. No começo, não entendia nada. Com o estudo, pouco a pouco, fui entendendo a parte processual e de mérito dos acórdãos. No quinto ano, já entendia tudo.
Estudava mais as matérias importantes no Concurso da Magistratura. Pela ordem: Processo Civil, Civil, Processo Penal, Penal, Constitucional e Administrativo. As outras, estudava para passar. Com média 7, passava-se de ano sem exames finais e sobrava-me mais tempo para estudar as matérias de relevância.
Formei-me e fiquei aguardando o edital do concurso no Diário Oficial. Mas eis que tive uma surpresa: a Lei do Interstício, exigindo, para concurso de Juiz de Direito, dois anos de exercício como advogado. Não os tinha. Procurei o Dr. Sílvio Marques Júnior, Promotor de Justiça e meu professor, narrando-lhe meu infortúnio. Aconselhou-me a ingressar no Ministério Público, que não exigia o biênio, e, passados dois anos, tentar a Magistratura.
Eu, que sabia mais Civil e Processo Civil, tive de estudar a fundo Penal e Processo Penal. Disseram-me, então, que havia uma obra nova com matérias que os autores clássicos não tratavam: “Curso de Direito Penal”, de José Frederico Marques. Estudei, pela primeira vez, tipicidade e tipo, especialmente a classificação dos elementos do tipo: objetivos, normativos e subjetivos. No Processo Penal, tomei emprestada uma revista de um advogado, a Revista de Processo, que trazia um artigo sobre a correlação entre a acusação e a sentença criminal.
Editais do concurso do Ministério Público: 20 vagas. Havia 10 interinos. Sobravam 10. Inscrevi-me e fui à luta. Prova escrita. Dissertação: Da correlação entre a acusação e a sentença! Uma das perguntas de Direito Penal: Conceito de elementos subjetivos e normativos do tipo! Nem era preciso fazer a prova. Já era Promotor de Justiça! Vontade de me levantar e perguntar ao fiscal da prova: “Qual é a minha comarca?”.
Fui aprovado e gostei do Ministério Público, no qual fiquei por 26 anos: Itu, Igarapava, Lençóis Paulista, Bariri, Pirajuí, Bauru e São Paulo. Quando estava em Lençóis Paulista, fui convidado para ser Assistente de Direito Penal de José Frederico Marques. Um grande orgulho para os meus 27 anos de idade. Aprofundei-me no Direito Penal. Um motivo a mais para ficar no Ministério Público. Havia sido seduzido pela Magistratura e acabei me casando com a Promotoria.
Por isso sempre falo: Quer ser aprovado no concurso? Quer ser Juiz de Direito? Então, faça, neste instante, uma opção de vida. A partir de agora, não há mais diferença entre dias comuns, fins de semana e feriados. Reduza o tempo de lazer. Estabeleça dois planos – de vida e de estudo – conjugados num só. Planifique seus dias, semanas e meses. Dê maior carga horária de estudo às matérias que sabe menos. Não descure das demais disciplinas. Estudar é “andar de caranguejo”. Não é só a para frente. É para a frente e para trás: estudar matérias novas e recordar as já estudadas.
Atente para o Português. O que mais reprova não é Processo Civil ou Civil. É o Português. No Ministério Público, quantas vezes examinadores já me disseram:
– Damásio, tecnicamente a prova dele é excelente, mas veja a redação. Como podemos mandar esse rapaz para uma comarca? Já imaginou como serão suas denúncias, petições e alegações?
Estudar quantas horas por dia?
Uma vez, perguntei a um velho professor dos meus tempos de faculdade:
– Que devo dizer aos meus alunos para que sejam aprovados nos concursos?
– O que nós dois fizemos, Damásio: estudar, pelo menos durante seis meses, 24 horas por dia – respondeu-me.
“24 horas de estudo por dia” é maneira de dizer. Ele pretendia sugerir: durante pelo menos seis meses, “dê tudo de si”, “estude o máximo que puder”.
Como estudar?
Prefiro perguntas e respostas. Leia e sublinhe só o mais importante. Alguns autores colocam a questão e passam páginas demonstrando a sua posição quanto à resposta. Leia tudo isso apenas uma vez, meditando e guardando na memória. Depois, anote um número ao lado da questão. No rodapé da página, coloque o mesmo número e faça a pergunta. Quando for recordar a matéria, não será preciso ler o livro inteiro.
Procure responder às perguntas numeradas. Não sabendo alguma, veja a resposta no número superior respectivo.
Em que livros estudar?
Aqui, você precisa de auxílio: alguém que conheça os concursos e saiba quais os autores preferidos. Em cada disciplina, há um autor (ou dois) que geralmente é o preferido de todas as comissões examinadoras.
Não se espante com a quantidade de pontos que são publicados nos editais dos concursos. Daquilo, só caem 30%. Mas como saber quais são os 30%?
Em primeiro lugar, estude os temas que estão em evidência em determinado momento, pois são de preferência do examinador, especialmente no oral. E lembre-se das novidades, como domínio do fato no concurso de pessoas, teoria do bem jurídico, imputação objetiva etc.
Depois, pesquise a própria “preferência do examinador”. Certa vez, o examinador de Direito Civil do Concurso da Magistratura de São Paulo, ilustre Desembargador, lecionava em Sorocaba. Mandei alguém investigá-lo na faculdade. Descobrimos que tinha preferência por certos pontos, inclusive divórcio e concubinato. Pedi ao meu professor que, disfarçadamente, três dias antes da prova escrita, revisasse esses temas. Domingo, dia da prova, dissertação: Do concubinato.
Não faça o primeiro concurso que aparecer. Alguns dizem que sabem que não vão ser aprovados; querem fazer o exame “só para ver como é”. É possível que objetivamente estejam dizendo “não faz mal, eu sabia que não ia passar” e seu subconsciente anote a derrota. Não acredito que alguém goste de colecionar perdas.
Nunca desista. Quem bate à porta da Magistratura, e ela não se abre, e continua batendo, “quer ser Juiz de Direito”. Quem bate uma vez, ela não se abre, e desiste: nunca quis ser Juiz de Direito. Nos concursos, “não há antecedentes”. A circunstância de prestar vários concursos não pesa contra o candidato. Ao contrário, revela seu ideal. Às vezes, a vitória está próxima e o candidato não sabe.
Certa vez, um nadador se pôs a atravessar o Canal da Mancha. Saindo de Calais, na França, na direção de Dover, na Inglaterra, faltavam-lhe apenas algumas centenas de metros para chegar à praia quando, sentindo-se cansado, voltou para a França… nadando. Não desista. É possível que lhe estejam faltando apenas algumas poucas centenas de metros para alcançar a sua aprovação.
Fonte: www.damasio.com.br