Processo RecInoCiv – RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP 5003542-29.2022.4.03.6311
Relator(a) Juiz Federal ALESSANDRA DE MEDEIROS NOGUEIRA REIS
Órgão Julgador 9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento 16/02/2024
Data da Publicação/Fonte DJEN DATA: 27/02/2024
EMENTA:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VISÃO MONCULAR CARACTERIZA IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO E DEFICIÊNCIA NOS TERMOS DA LEI. CONDIÇÕES DE MORADIA APURADAS APENAS NA PERÍCIA SOCIOECONÔMICA. MODIFICAÇÃO DA RENDA FAMILIAR APÓS A DER. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO PARA CONCEDER O BENEFÍCIO A PARTIR DO LAUDO SOCIOECONÔMICO. RECURSO DA AUTORA PARA RETROAÇÃO DA DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO E FIXAÇÃO DA DIB NA DER QUE SE NEGA PROVIMENTO. RECURSO DO INSS QUE SE NEGA PROVIMENTO CONSIDERANDO QUE A VISÃO MONOCULAR CONFIGURA DEFICIÊNCIA E IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. SENTENÇA MANTIDA.
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando a concessão de benefício de prestação continuada no âmbito da Assistência Social, na condição de portador de impedimento de longo prazo.
O MM. Juízo Federal a quo proferiu sentença, julgando o pedido parcialmente procedente para determinar a implantação do benefício assistencial de prestação continuada a partir da perícia socioeconômica.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso, requerendo a retroação do termo inicial do benefício para a data do requerimento administrativo.
O INSS requer a reforma da sentença considerando que a autora, portadora de visão monocular, não comprova o impedimento de longo prazo. Aduz que a classificação da visão monocular como deficiência sensorial, nos termos da Lei nº 12.126/21, não implica preenchimento do requisito subjetivo para fins de concessão do benefício em análise. Alega que a visão monocular prejudica apenas a realização de atividades que requerem trabalho a curta distância da visão, como a de motorista, ou perigosas ou em atividades em altura. Sustento que no caso concreto a autora reúne condições para uma vida com autonomia pessoal e laboral, de modo que não resta comprovado o impedimento de longo prazo obstativo de participação plena na sociedade. Há contrarrazões pela parte autora.
É o relatório. Decido.
V O T O
DO RECURSO DO INSS
No caso em pauta, a perícia médica constatou que a autora, 41 anos de idade, ensino médio, cuidadora de idosos, é portadora de visão monocular.
Consta do laudo pericial (ID 278767409) “conclui-se que a autora é portadora de cegueira legal (CID-10: H54.4 – Cegueira em um olho) de acordo com a Lei 14.126/2021, que classifica a visão monocular como uma deficiência sensorial do tipo visual, contudo, não se vislumbra incapacidade laboral.”.
Em que pese o perito médico tenha afirmado a ausência de incapacidade para o trabalho e para a vida independente, tem-se que a cegueira monocular é doença classificada como deficiência para todos os fins de direito, conforme lei 14.126/2021:
“Art. 1º Fica a visão monocular classificada como deficiência sensorial, do tipo visual, para todos os efeitos legais. Parágrafo único. O previsto no § 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), aplica-se à visão monocular, conforme o disposto no caput deste artigo.”.
Portanto, a visão monocular é considerada como deficiência para fins de concessão de BPC.
Neste sentido:
LOAS.BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. RECURSO DO INSS IMPUGNA O REQUISITO SUBJETIVO. LAUDO PERICIAL.VISÃO MONOCULAR.DEFICIÊNCIA COMPROVADA. BENEFÍCIO DEVIDO. ART. 46 DA LEI 9.099/95. REFORMADA EM PARTE A SENTENÇA PARA AJUSTE DA DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO. FIXAÇÃO NA DATA DE ENTRADA NO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DAS SÚMULAS 22 E 33 DA TNU. RECURSO DO RÉU DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PROVIDO. (TRF 3ª Região, 15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, RecI no Civ – RECURSO INOMINADO CÍVEL – 0009891-03.2021.4.03.6301, Rel. Juiz Federal RODRIGO OLIVA MONTEIRO, julgado em 23/02/2022, DJEN DATA: 04/03/2022).
Nesse quadro, nego provimento ao recurso do INSS.
DO RECURSO DA PARTE AUTORA.
Não assiste razão ao Autor.
No caso em pauta, verifico que a autora, 41 anos de idade, não comprova a situação de alta vulnerabilidade social DER 31/01/2022.
A Autora reside em imóvel alugado, juntamente com seus filhos Ian e Vinicius. Ocorre que, após a DER, há comprovação de alteração das condições econômicas considerando que Ian trabalhou no Condomínio Costa Atlântica no Guarujá durante o período de 19/12/2022 até 01/02/2023, e recebeu salário superior a R$ 2.800,00 em janeiro/2023.
Portanto, considerando a alteração das condições socioeconômicas após a DER, entendo que o benefício deve ser concedido a partir da pericia socioeconômica, nos termos da sentença recorrida.
Acrescento que o laudo socioeconômico não comprova a alta vulnerabilidade para período pretérito.
Abaixo, seguem algumas fotos da moradia, extraídas do laudo socioeconômico:
Consta do laudo socioeconômico:
“A família reside há sete anos no imóvel alugado. Segundo relatos no terreno existem diversos cômodos individuais alugados para outras famílias. A moradia visitada, localizada no piso superior construída em alvenaria, distribuída em um quarto/sala, cozinha, banheiro e uma pequena área. O banheiro é azulejado e os demais cômodos apresentam pintura em látex, piso em cerâmica e alguns focos de unidade nas paredes. Abastecida com a rede de água, esgoto sanitário, luz elétrica e serviço de internet. Os mobiliários, aparelhos e utensílios domésticos (cama de casal, televisão, rack, geladeira, fogão, máquina de lavar, mesa e armários de cozinha, cadeiras, entre outros objetos) são simples, aparentando estado de conservação regular e atendem as necessidades básicas da família. O bairro conta com infraestrutura urbanística regular, ruas e calçadas parcialmente pavimentadas, iluminação pública e saneamento básico deficientes, serviço de correio, coleta de lixo, comércios, serviços de telecomunicações, transporte urbano, entidades religiosas, equipamentos de saúde, educação, e serviços socioassistenciais nas proximidades. (…) Conforme relatório médico a autora é portadora de cegueira total do olho direito e parcial no olho esquerdo. Faz acompanhamento médico particular há cinco anos com o mesmo profissional. Alega que passou por algumas dificuldades em conseguir acesso ao serviço especializado na rede pública. Sempre consegue um desconto no valor da consulta e essa é custeada por familiares. A família reside em condições modestas em um bairro com infraestrutura urbanística regular. Sra. Diana, com deficiência visual, em idade produtiva atualmente trabalha como diarista realizando duas faxinas por mês. Cita que já pensou, em fazer o curso de Braile mas ainda não conseguiu. Alega que nunca foi orientada a procurar alguma instituição que atenda pessoas com deficiência visual. É fato que existe pouca oferta de locais que ofereça um atendimento especializado, humanizado e comprometido com a qualificação, capacitação e inserção das pessoas com deficiência visual no mercado de trabalho. E esse tem sido um grande impeditivo na vida das pessoas com deficiência. É indispensável um esforço conjunto de toda a sociedade no sentido de exigir que a lei das cotas seja efetivamente cumprida pelas empresas. Pois, compreendo que a garantia de direitos não passa apenas pela concessão do benefício socioassistencial. A pessoa com deficiência tem direito ao acesso a uma vida laboral, social, esportiva, cultural, entre outros fatores que viabilizem a sua autonomia, independência e inclusão social. Frente ao exposto consideramos que a família apresenta uma situação de insegurança alimentar e vulnerabilidade social. O valor da renda per capita foi de R$213,33 reais (duzentos e treze reais e trinta e três centavos), valor que caracteriza a situação de Hipossuficiência Econômica da Sra. Diana Machado Sampaio.”.
Portanto, não comprovada a alta vulnerabilidade na DER, diante das condições de moradia narradas no laudo socioeconômico, e também considerando a alteração das condições econômicas do grupo familiar, nego provimento ao recurso da parte autora. Ante o exposto, nego provimento ao recurso da parte Autora e nego provimento ao recurso do INSS.
Diante da sucumbência recíproca, deixo de fixar condenação em honorários advocatícios e custas.
É o voto.
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VISÃO MONCULAR CARACTERIZA IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO E DEFICIÊNCIA NOS TERMOS DA LEI. CONDIÇÕES DE MORADIA APURADAS APENAS NA PERÍCIA SOCIOECONÔMICA. MODIFICAÇÃO DA RENDA FAMILIAR APÓS A DER. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO PARA CONCEDER O BENEFÍCIO A PARTIR DO LAUDO SOCIOECONÔMICO. RECURSO DA AUTORA PARA RETROAÇÃO DA DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO E FIXAÇÃO DA DIB NA DER QUE SE NEGA PROVIMENTO. RECURSO DO INSS QUE SE NEGA PROVIMENTO CONSIDERANDO QUE A VISÃO MONOCULAR CONFIGURA DEFICIÊNCIA E IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. SENTENÇA MANTIDA. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Visto, relatado e discutido este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Nona Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região – Seção Judiciária de São Paulo, por maioria, negar provimento ao recurso da parte Autora e negar provimento ao recurso do INSS, nos termos do voto da Juíza Relatora. Vencida a Doutora Marisa Regina Amoroso Quedinho Cassetari, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Objeto do Processo
VIDE EMENTA
Inteiro Teor
http://www.trf3.jus.br/trf3r/index.php?id=20&op=resultado&processo=50035422920224036311